Opinião: O Admirável Mundo sem Associações

Por


Joana Fitas *

Imaginemos, por um instante, um mundo ideal, onde o poder local é finalmente liberto de uma das suas maiores e mais injustas obrigações: apoiar as associações. Afinal, para quê gastar tempo e recursos públicos com estas entidades que, sejamos francos, não têm qualquer obrigação de existir?
Para sermos honestos, num mundo perfeitamente mecânico, quem precisa de associações? Para que haveria de existir um grupo de pessoas que dedica horas, dias e, em muitos casos, uma vida inteira a organizar atividades culturais, sociais, desportivas ou recreativas? Qual o valor dessas pessoas que promovem a cultura local, que preservam tradições, que ensinam as crianças a tocar instrumentos ou a jogar xadrez?
Aliás, porquê a preocupação em ter espaços comunitários? Os cidadãos não têm qualquer obrigação de ter locais onde possam socializar, aprender, ou simplesmente passar o tempo. Estão tão bem em casa, a interagir com o mundo através das redes sociais, que necessidade terão de um salão de festas, de um campo de futebol, de um auditório? Não, não, esse tipo de luxo é um capricho [aparentemente] desnecessário.
E, claro, também não temos de valorizar as associações pelo trabalho que fazem. Aquelas pequenas iniciativas que organizam, como concertos de música local, feiras do livro, festivais de teatro amador, ou até simples convívios entre vizinhos, são eventos totalmente supérfluos. Não há qualquer razão para que o poder local as apoie, e muito menos para que as pessoas reconheçam o seu valor.
Portanto, neste mundo [paralelo], deixemos que as associações desapareçam, uma a uma, como folhas caídas. Deixemos que os edifícios se transformem em escombros, testemunhos silenciosos de um passado em que, por algum motivo inexplicável, as pessoas sentiam a necessidade de se juntar e criar algo em conjunto.
E, claro, não nos preocupemos. Afinal, como já disse, o poder local não tem qualquer obrigação de apoiar associações. E, de facto, ninguém tem qualquer obrigação de as frequentar, de participar nas suas atividades, ou de lamentar a sua ausência. Não há qualquer necessidade de nos preocuparmos com isso.
Afinal, quem precisa disso?
Precisamos TODOS! Não somos um mundo mecânico, pelo contrário, somos uma sociedade que se vai mantendo funcional também às custas do trabalho destas pessoas e organizações. Daí que defendamos que esta seja, também, uma obrigação do poder público, seja ela moral ou legalmente instituída. Valorizar e dignificar, porque é assim que se constrói a sociedade, um conjunto de pessoas que se harmoniza entre si e com o espaço, que se cuida, ampara, ensina, preserva…
Pela defesa do Movimento Associativo Popular e Voluntário. Da cultura, arte, recreio, desporto e solidariedade promovidos pelas nossas associações. Viva Alfena, Ermesinde, Campo e Sobrado, e Valongo.

* Presidente da ACC Valongo